segunda-feira, 29 de junho de 2015

Para que mesmo, serve a arte?

“… fixa e tornar acessível aos mais humanos dos homens, o espetáculo de que participam sem perceber”[1]
Maurice Merleau-Ponty
Até bem pouco tempo o cérebro humano era um mistério para a Ciência. Grandes e importantes descobertas no século XX desvendaram um pouco mais da sua estrutura  e do seu funcionamento. Nosso cérebro é dividido em dois hemisférios; no hemisfério esquerdo articulado, localizam-se centros  responsáveis pelos raciocínios exatos, objetivos, digital, e também pela linguagem; no hemisfério direito desarticulado, analógico, holístico, não verbal, abriga as regiões responsáveis pelas emoções e pela nossa subjetividade.
“o ponto principal dessas descobertas … é que parece existir duas modalidades de pensamento, verbal e não-verbal, representadas separadamente nos hemisférios esquerdo e direito , respectivamente, e que o nosso sistema educacional, bem como a ciência de modo geral, tende a desprezar a forma não- verbal do intelecto.”[2]
   Por essa razão, costuma-se dizer  que o ser humano aprendeu a  utilizar apenas um terço da sua capacidade cerebral.
Sabe-se  também,  que o cérebro como qualquer músculo, precisa se exercitar. O emprego continuado fortalece as fibras nervosas que constituem as conexões entre os neurônios e libera mais neurotransmissores, substâncias químicas que cruzam as sinapses, os espaços entre eles.[3]
 O hemisfério esquerdo do cérebro é estimulado, pelos raciocínios matemáticos e pelas atividades cotidianas. Mas no hemisfério direito, certas conecções só se concretizam através da arte, tanto na criação como na fruição. Pois na experiencia estética  nossos sentidos são exigidos de maneira específica, não genérica como acontece ordinariamente. Sem o contato com a Arte existem conecções que jamais ocorrerão,e que criadas, precisarão ser fortalecidas. Esta é uma das funções da Arte; aumentar nossa capacidade cerebral.
Para alguns pensadores, a mecanização, a automação e a individualização do nosso tempo são as grandes responsáveis pelo aumento da violência, e até mesmo pelo constante aumento do uso de drogas.  Segundo Duarte Júnior, tais condições
“ que produzem  uma hipertrofia da razão em detrimento da emoção, conduzem a violência e a alienação. A violência como uma forma de fazerem os nervos vibrarem, ou a alienação  quando a vida não faz mais sentido”[4].
Em contrapartida o autor propõem uma educação sensível, pois nem só a violência, rebeldia e a gritaria são elementos que podemos utilizar para expressar nossa humanidade.
Da mesma forma, Charles Darwin afirmava que a ciência o tornou insensível, e falava das possíveis consequências disso:
  “ Perdi o gosto pela arte. Meu espírito parece ter-se convertido numa máquina de extrair leis gerais de grandes acumulações de fatos(…)A perda da receptividade para essas coisas ( as artes) é uma perda da felicidade, possivelmente prejudica não só o intelecto, como também o caráter moral, já que debilita a parte excitável da nossa natureza”.[5]

A arte serve então, para valorizar os aspectos inaproveitados da natureza, tornando o ser humano consciente de si próprio e projetando tal consciência na realidade que o cerca.
 Grupos artísticos em todo o Brasil comprovam o poder de integração social da arte, propiciando o desenvolvimento de talentos inatos e consequente  aumento da auto estima, empoderamento e resgate identitário de comunidades inteiras.
Para o filósofo grego Aristóteles a arte tinha ainda uma função curativa provocando a catarse; através da música do teatro e da poesia o espectador é incentivado a sentir fortes emoções como o medo, a piedade ou o entusiasmo, sem cair no desespero. A catarse contribuia para fortalecer o espírito de comunidade na platéia.
            Procuramos aqui, tornar visível alguma serventia da arte, correspondendo ás necessidades humanas.
“ A obtenção do prazer é um dos principais objetivos da arte. Embora o prazer estético e o prazer  artístico sejam de natureza especial, não se deve insistir na sua superioridade. Fundamentalmente trata-se de um prazer como outro qualquer. Apenas mais totalizador e de maiores ressonâncias psíquicas.”[6]
                A este prazer estético que deve abranger a totalidade da atividade humana, da´-se o nome de estesia, que vem a ser o contrário de anestesia. Precisa mais?

                                                                                                                  Sandra Simões




[1]  MERLEAU-Ponty, Maurice. o olho e o espírito. São PauloCosac & Naif,2002
 [2] EDWARDS, Betty- Desenhando com o Lado Direito do Cérebro.Rio de Janeiro: Ediouro,2012.p 11
[3] CRICK, Francis.Refletindo sobre o cérebro.Scientifc American, set de 1979, p 229,230.
[4] DUARTE Junior, J Francisco. Porque Arte-educação? Campinas: Papirus,1985.
[5] GARDNER, Howard. As Artes e o Desenvolvimento Humano.Poa: Artmed,1997.
[6] TREVISAN, Armindo. Como apreciar a arte.Porto Alegre: Editora AGE, 2003.p59.