Para que mesmo, serve a arte?
“… fixa e tornar acessível aos mais humanos dos homens, o espetáculo de
que participam sem perceber”[1]
Maurice Merleau-Ponty
Até bem pouco tempo o cérebro humano
era um mistério para a Ciência. Grandes e importantes descobertas no século XX
desvendaram um pouco mais da sua estrutura
e do seu funcionamento. Nosso cérebro é dividido em dois hemisférios; no
hemisfério esquerdo articulado, localizam-se centros responsáveis pelos raciocínios exatos,
objetivos, digital, e também pela linguagem; no hemisfério direito desarticulado,
analógico, holístico, não verbal, abriga as regiões responsáveis pelas emoções
e pela nossa subjetividade.
“o ponto principal dessas descobertas
… é que parece existir duas modalidades de pensamento, verbal e não-verbal,
representadas separadamente nos hemisférios esquerdo e direito ,
respectivamente, e que o nosso sistema educacional, bem como a ciência de modo
geral, tende a desprezar a forma não- verbal do intelecto.”[2]
Por essa razão, costuma-se dizer que o ser humano aprendeu a utilizar apenas um terço da sua capacidade cerebral.
Sabe-se também, que o cérebro como qualquer músculo, precisa
se exercitar. O emprego continuado fortalece as fibras nervosas que constituem
as conexões entre os neurônios e libera mais neurotransmissores, substâncias
químicas que cruzam as sinapses, os espaços entre eles.[3]
O hemisfério esquerdo do cérebro é estimulado,
pelos raciocínios matemáticos e pelas atividades cotidianas. Mas no hemisfério direito,
certas conecções só se concretizam através da arte, tanto na criação como na
fruição. Pois na experiencia estética
nossos sentidos são exigidos de maneira específica, não genérica como
acontece ordinariamente. Sem o contato com a Arte existem conecções que jamais
ocorrerão,e que criadas, precisarão ser fortalecidas. Esta é uma das funções da
Arte; aumentar nossa capacidade cerebral.
Para alguns pensadores, a
mecanização, a automação e a individualização do nosso tempo são as grandes
responsáveis pelo aumento da violência, e até mesmo pelo constante aumento do uso
de drogas. Segundo Duarte Júnior, tais
condições
“ que produzem uma hipertrofia da razão em detrimento da
emoção, conduzem a violência e a alienação. A violência como uma forma de fazerem
os nervos vibrarem, ou a alienação
quando a vida não faz mais sentido”[4].
Em contrapartida o autor propõem uma
educação sensível, pois nem só a violência, rebeldia e a gritaria são elementos
que podemos utilizar para expressar nossa humanidade.
Da mesma forma, Charles Darwin
afirmava que a ciência o tornou insensível, e falava das possíveis consequências
disso:
“ Perdi
o gosto pela arte. Meu espírito parece ter-se convertido numa máquina de
extrair leis gerais de grandes acumulações de fatos(…)A perda da receptividade
para essas coisas ( as artes) é uma perda da felicidade, possivelmente
prejudica não só o intelecto, como também o caráter moral, já que debilita a
parte excitável da nossa natureza”.[5]
A arte serve então, para valorizar os
aspectos inaproveitados da natureza, tornando o ser humano consciente de si próprio
e projetando tal consciência na realidade que o cerca.
Grupos artísticos em todo o Brasil comprovam o
poder de integração social da arte, propiciando o desenvolvimento de talentos
inatos e consequente aumento da auto
estima, empoderamento e resgate identitário de comunidades inteiras.
Para o filósofo grego Aristóteles a
arte tinha ainda uma função curativa provocando a catarse; através da música do
teatro e da poesia o espectador é incentivado a sentir fortes emoções como o
medo, a piedade ou o entusiasmo, sem cair no desespero. A catarse contribuia
para fortalecer o espírito de comunidade na platéia.
Procuramos
aqui, tornar visível alguma serventia da arte, correspondendo ás necessidades
humanas.
“ A obtenção do prazer é um dos
principais objetivos da arte. Embora o prazer estético e o prazer artístico sejam de natureza especial, não se
deve insistir na sua superioridade. Fundamentalmente trata-se de um prazer como
outro qualquer. Apenas mais totalizador e de maiores ressonâncias psíquicas.”[6]
A
este prazer estético que deve abranger a totalidade da atividade humana, da´-se
o nome de estesia, que vem a ser o
contrário de anestesia. Precisa mais?
Sandra Simões
[1] MERLEAU-Ponty,
Maurice. o olho e o espírito. São PauloCosac & Naif,2002
[3] CRICK, Francis.Refletindo sobre o cérebro.Scientifc American, set de 1979, p
229,230.
[4] DUARTE Junior, J Francisco. Porque
Arte-educação? Campinas: Papirus,1985.
[5] GARDNER, Howard. As Artes e o Desenvolvimento Humano.Poa: Artmed,1997.