"A chama que me arde mora além dos olhos que tu tens"Lari Franchesquetto |
Sobre Ver e Olhar
por Sandra Simões
Vivemos uma “
civilização das imagens” diferente de tempos anteriores do predomínio da voz e
posteriormente da escrita. Falamos aqui das imagens do cotidiano, e não apenas
das imagens artísticas.
Em um mundo globalizado, massificado pelas
imagens veiculadas pela mídia, as sensações entram por nossos olhos como coisa
pronta, acabada. São imagens de fácil reconhecimento que induzem a uma leitura
superficial, impedem o indivíduo de imaginar, de pensar o novo. A
imaginação esvaziada e a gratuidade dos
sentidos produz angústia e alienação, hipertrofiando a razão. Sem imaginação não
há emoção, os nervos não vibram, os sentidos se anulam frente as vivências e
experiências cotidianas.
“A hipertrofia
da razão, em detrimento da emoção conduz à violência e à alienação. A violência
como única forma de fazer os nervos vibrarem. À alienação quando a vida não faz
mais sentido.” Duarte Junior
Imaginação?
Mas para que
imaginação?
A imaginação propicia o simbolizar, atribuir
outros sentidos à objetos e acontecimentos. Simbolizar é o que diferencia o homem das outras
espécies. A capacidade de simbolizar transforma a vida biológica em coisa qualitativamente
diferente. Merleau-Ponty denomina o
comportamento humano como “ comportamento
simbólico”. O animal reage
aos estímulos. O homem age em função
dos significados que imprime à realidade
“ A imaginação
é um dos modos pelos quais a consciência
apreende o mundo e o elabora. Pela
imaginação o ser humano organiza o mundo numa estrutura significativa. Projeta
o que ainda não existe, o devir, o que poderá vir a ser.” Teixeira Coelho
As imagens são
símbolos. São recheadas de significados, de significância existencial. E estão
aí para serem compreendidas em sua essência,
decifradas além da aparência.
A profusão de
imagens, principalmente as estereotipadas “ elimina não apenas todo o sentido,como
as próprias imagens”. Um processo de inflação simbólica tornando o olho cego à riqueza das nuances, à
alteridade, ao desconhecido, ao
estranhamento. Imagens que por seu reconhecimento fácil se esvaziam de tudo que
convoque o pensar. É a superficialidade
provocando o excesso de certezas dos tempos atuais, a solidificação de verdades
estereotipadas.
Olhar é muito mais que ver.
Olhar nos faz diminuir a pressa; ver é
próprio da rapidez. Ver é um ato
fisiológico decorrente do sentido da visão. Vemos porque temos olhos. Olhar
é o fator biológico somado à uma intenção consciente, que gera idéias,
questionamentos e conclusões.
“ Ver é reto, olhar
é sinuoso. Ver é sintético, olhar é analítico. Ver é imediato, olhar é
mediado.” Márcia Tíburi
Para Didi-Huberman, a imagem é uma
forma específica de se pensar o tempo histórico-social. Portanto, pensar as
imagens é pensar a realidade. Mediado em um processo dialógico de produção de significações sobre a experiência
vivida, sobre o que se vê, não apenas o que caracteriza o mundo da natureza,
mas sim de uma realidade significada,
portanto criada, que constitui o mundo da cultura, da realidade,
característicos de uma época e um lugar.
Uma imagem nos convoca a pensar,
nos choca e nos instiga. Carlos Drumond de Andrade escreve um poema pertinente,
Chega mais perto e contempla as palavras.(as imagens, eu acrescento)
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
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